O Que Significa Perdoar?
José tinha apenas
dezessete anos quando seus irmãos, friamente, venderam-no para a
escravidão. Separado de sua família e do seu país, ele atingiu a posição
de supervisor da casa de Potifar, seu senhor egípcio. Mas o desastre
atingiu-o novamente. Ele recusou os avanços sexuais da esposa de Potifar
e ela acusou-o falsamente de assediá-la. Ele foi posto na prisão, onde,
mais uma vez, o Senhor estava com ele e se tornou o supervisor dos
outros prisioneiros. José permaneceu nessa prisão pelo menos durante
dois anos (Gênesis 37; 39).
Faraó,
rei do Egito, teve um sonho e desejava sua interpretação. José foi
capaz, pelo poder de Deus, de interpretar o sonho de Faraó e foi
exaltado a uma posição de poder próxima à do próprio Faraó. Este fê-lo
encarregado da armazenagem e da distribuição dos cereais em toda a terra
do Egito. Foi depois disto que os irmãos de José vieram ao Egito para
comprar cereais. Estava dentro do poder de José tomar vingança contra
aqueles que tinham pecado contra ele tantos anos atrás. Contudo, a
Bíblia nos conta que José experimentou seus irmãos e, tendo visto o
arrependimento deles, recebeu-os com lágrimas e afeto (Gênesis 45:1-15).
Ele os tinha perdoado por seu pecado.
Muitas
pessoas não perdoariam, como José o fez. Não é fácil, freqüentemente,
perdoar, e quanto maior a intimidade que temos com aquele que peca
contra nós, mais difícil é perdoá-lo. As Escrituras nos ensinam,
contudo, que a má vontade em perdoar os outros nos retira o perdão
divino. Jesus ensinou: "Porque, se perdoardes aos homens as suas
ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não
perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará
as vossas ofensas" (Mateus 6:14-15). Desde que todos os
indivíduos responsáveis diante de Deus necessitam de perdão, é portanto
indispensável que entendamos e pratiquemos o perdão.
A palavra grega
traduzida como "perdoar" significa literalmente cancelar ou remir.
Significa a liberação ou cancelamento de uma obrigação e foi algumas
vezes usada no sentido de perdoar um débito financeiro. Para entendermos
o significado desta palavra dentro do conceito bíblico de perdão,
precisamos entender que o pecador é um devedor espiritual. Até Jesus
usou esta linguagem figurativa quando ensinou aos discípulos como orar: "e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores"
(Mateus 6:12). Uma pessoa se torna devedora quando transgride a lei de
Deus (1 João 3:4). Cada pessoa que peca precisa suportar a culpa de sua
própria transgressão (Ezequiel 18:4,20) e o justo castigo do pecado
resultante (Romanos 6:23). Ele ocupa a posição de pecador aos olhos de
Deus e perde sua comunhão com Deus (Isaías 59:1-2; 1 João 1:5-7).
A
boa nova do evangelho é que Jesus pagou o preço por nossos pecados com
sua morte na cruz. Quando aceitamos o convite para a salvação através de
nossa obediência aos mandamentos de Deus, ele aceita a morte de Jesus
como o pagamento de nossos pecados e nos livra da culpa por nossas
transgressões. Não ficamos mais na posição de infratores da lei ou
devedores diante de Deus. Somos perdoados!
O
perdão, então, é um ato no qual o ofendido livra o ofensor do pecado,
liberta-o da culpa pelo pecado. Este é o sentido pelo qual Deus
“esquece” quando perdoa (Hebreus 8:12). Não que a memória de Deus seja
fraca. Por exemplo, Deus lembrou-se do pecado de Davi a respeito de
Bate-Seba e Urias muito tempo depois que Davi tinha sido perdoado (2
Samuel 12:13; 1 Reis 15:5). Ele liberta a pessoa perdoada da dívida do
seu pecado, isto é, cessa de imputar a culpa desse pecado à pessoa
perdoada (veja Romanos 4:7-8).
É importante entender
que o perdão de Deus é condicional. Deus perdoa livremente no sentido
que ele não exige a morte do pecador que responde a seu convite de
salvação, permitindo que a morte de Jesus pague a pena por seus pecados.
Contudo, Deus exige fé, arrependimento, confissão de fé e batismo como
condições para o perdão do pecador estranho (Marcos 16:16; Atos 2:37-38;
8:35-38; Romanos 10:9-10). O perdão é também condicional para o cristão
que peca. O arrependimento, a mudança de pensamento, precisam ocorrer
antes que o perdão divino seja estendido (Atos 8:22). Deus nos chama a
perdoar assim como ele perdoa. Quando alguém peca contra mim, ele se
torna um transgressor da lei de Cristo. Eu o considero um pecador. Se
ele se arrepende e pede para ser perdoado, eu tenho que perdoá-lo, isto
é, libertá-lo de sua culpa como transgressor. Quando eu o perdoo, não o
considero mais um pecador. Posso não ser literalmente capaz de esquecer o
pecado que ele cometeu mais do que Deus literalmente "esquece" nossos
pecados, mas preciso deixar de atribuir a ele a culpa pelo seu pecado.
Deste modo, eu o liberto de sua "dívida"”
E
se o pecador não se arrepender? Tenho que perdoar aquele que peca
contra mim, mas não se arrepende? Talvez esta pergunta seja melhor
respondida pelas palavras de Jesus: "Acautelai-vos. Se teu irmão
pecar contra ti, repreende-o; se ele se arrepender, perdoa-lhe. Se, por
sete vezes no dia, pecar contra ti e, sete vezes, vier ter contigo,
dizendo: Estou arrependido, perdoa-lhe" (Lucas 17:3-4). Jesus
indicou que o perdão deveria ser estendido quando o pecador se arrepende
e confessa seu pecado. Precisamos também lembrar que Deus sempre exige
arrependimento como condição de divino perdão. Deus não exige de nós o
que ele mesmo não está querendo fazer.
De fato, se
libertamos o pecador de sua culpa sem arrependimento, encorajamo-lo a
continuar em seus modos destruidores. O perdão não é a desculpa pelo
pecado. Algumas pessoas "esquecem," isto é, ignoram os pecados cometidos
contra elas porque têm medo de enfrentar o pecador. Entretanto a Bíblia
é bem explícita sobre o curso da ação a ser seguida quando um irmão
peca contra mim (Lucas 17:3; Mateus 18:15-17). O perdão fala de
misericórdia, mas não deverá ser confundido com a tolerância e permissão
do pecado. O Senhor perdoará ou punirá o pecador, dependendo da reação
do pecador ao evangelho, mas ele não tolera a iniquidade.
A
Bíblia ensina que o direito de vingança pertence ao Senhor (Romanos
12:17-21). O perdão, contudo, não é simplesmente uma recusa a tirar
vingança. Algumas vezes a pessoa ofendida abstém-se de responder ao mal
com o mal, mas não está querendo libertar o pecador de sua condição de
transgressor mesmo quando o pecador se arrepende. A pessoa contra quem
se pecou pode querer usar o pecado como um cacete para castigar o
pecador, mencionando-o de vez em quando para vergonha do pecador. Se
perdoo meu irmão, tenho que "esquecer" seu pecado no sentido que não
mais o atribuo a ele.
O
perdão não é a remoção das consequências temporais de nosso pecado. O
homem que assassina outro pode arrepender-se e procurar o perdão, mas
ainda assim sofrerá o castigo temporal da lei humana. Mesmo se perdoado,
pode ter que passar o resto de sua vida na prisão. O perdão remove as
consequências eternas do pecado!
O pecado danifica as
relações entre as pessoas como prejudica nossa relação com nosso
Criador. A pessoa contra quem se pecou frequentemente se sente ferida,
talvez irada pela injustiça do pecado cometido. O perdão é necessário
para a cura espiritual da relação, mas precisamos preparar nossos
corações para perdoar. Precisamos aceitar a injustiça do ferimento, a
deslealdade do pecado, e ficarmos prontos para perdoar (observe os
exemplos de Jesus e Estevão; Lucas 23:34; Atos 7:60). Mesmo se o pecador
se recusar a se arrepender, não podemos continuar a nutrir a raiva, ou
ela se tornará em ódio e amargura (veja Efésios 4:26-27,31-32). Ainda
que o pecador possa manter sua posição como transgressor por causa de
sua recusa a se arrepender, seu pecado não deverá dominar meu estado
emocional.
E se o pecador
se arrepender? Como posso aprender a perdoar? Jesus contou uma parábola
sobre um servo que devia uma quantia enorme (10.000 talentos) ao seu rei
(Mateus 18:23-35). Ele era incapaz de pagar a dívida e implorou ao rei
por compaixão. O rei perdoou-o por sua enorme dívida, mas este servo
prontamente saiu e encontrou um dos seus companheiros servos que devia a
ele uma quantia relativamente pequena e exigiu pagamento, agarrando-o
pelo pescoço. Ainda que o companheiro de servidão implorasse por
compaixão, o credor entregou-o à prisão. Quando o rei foi informado dos
atos de seu servo incompassivo, irou-se e reprovou este servo,
entregando-o aos torturadores até que ele pagasse totalmente sua dívida.
É claro que estamos representados na parábola pelo servo que tinha uma
dívida enorme. Não há comparação entre as ofensas que temos cometido
contra Deus e aquelas que têm sido cometidas contra nós. Jesus observou
que, justo como no caso do servo não misericordioso, o Pai não nos
perdoará por nossas infraçõe se não perdoarmos nossos companheiros
(18:35; veja também Mateus 5:7).
Para
nos prepararmos para perdoar, precisamos lembrar que nós mesmos somos
pecadores e necessitados do perdão divino (Romanos 3:23). No caso do
cristão, Deus já lhe perdoou uma imensa dívida no momento do batismo.
Quando nos lembramos da grandeza da dívida que Deus quer nos perdoar,
certamente podemos perdoar aqueles que nos devem muito menos em
comparação (Efésios 4:32; Colossenses 3:13)
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